Artigo de especialista –
Profa. Dra. Ana Lydia Sawaya –
Unifesp/ CREN –
Será verdade que ao abrir a tampa de uma garrafa de refrigerante seremos realmente felizes? A ciência vem mostrando que o slogan “abra a felicidade se traduz no contrário. Refrigerantes e comidas ricas em açúcar, sal e gorduras geram vício alimentar, estão na base do aumento da obesidade e de muitos problemas de saúde, como o diabetes e as doenças cardiovasculares.
As indústrias de alimentos e bebidas têm explorado cada vez mais a associação entre prazer e felicidade, pois descobriram que esses processos associativos aumentam muito a venda de seus produtos. Eis outros exemplos: “amo muito tudo isso”, “com sabor de quero mais”, ou ainda “exageradamente gostoso” e “um sabor inesquecível”. Mas, prazer e felicidade não são sinônimos.
Abra a felicidade?
Os antigos gregos diferenciaram bem essas duas experiências mostrando que podem até ser antagônicas. Usaram a palavra “eudaimonia” para descrever a experiência de felicidade (ter um espírito bom) e a palavra “hedonia” para descrever o sentimento de prazer. Diziam que pouco prazer traz infelicidade, mas muito prazer traz infelicidade também e que a felicidade esta no meio termo e na capacidade de autodomínio. Nem muito, nem pouco.
Para eles, a raiz da felicidade está em saber decidir, ter liberdade para decidir pelo bem. E a felicidade é proporcional ao ser livre das coisas materiais. Assim, o apego excessivo ou incontrolado a algo gera infelicidade.
Um monge do deserto chamado Evágrio Pôntico dizia: “seja o porteiro do seu coração e não deixe entrar nenhum pensamento sem interroga-lo. Interrogue cada pensamento individualmente e diga-lhe: você é um dos nossos ou um dos nossos adversários? Se for da casa, vai enchê-lo de paz. Mas se for do inimigo, vai perturbá-lo pela raiva ou provoca-lo pela cobiça (carta II, 345-399 DC)”.
Vício alimentar
A ciência está cada vez mais de acordo com esses antigos sábios, pois estudos científicos têm mostrado que quando uma criança toma refrigerante seu cérebro memoriza o sabor, o aroma, o barulho de abrir a garrafa, as bolhinhas que faz e, para o resto da vida, desejará este prazer e o terá guardado em sua memória. E quando tiver oportunidade, tomará de forma excessiva essa bebida. Algo parecido com o vício do cigarro ou da cocaína. Todas as bebidas adocicadas e industrializadas têm esse efeito.
Se uma mãe toma refrigerante frequentemente ou todos os dias durante a gravidez, o cérebro da criança terá uma atenção saliente e uma busca frequente por esta bebida após o nascimento. Isto acontece porque alimentos ricos em açúcar, gordura e sal geram, mais do que outros alimentos, emoções positivas que aumentam a motivação para obtê-los, tão logo são lembrados ou estão disponíveis ao alcance da mão, ou seja, ingeri-los é recompensador. Por quê?
Descontrole alimentar
Porque sal, açúcar e gordura eram ingredientes muito difíceis de serem encontrados na natureza. O sal era considerado ouro na antiguidade; e a gordura vinha da caça e exigia grande esforço para ser obtida. Por isso nosso cérebro procura preferencialmente estes ingredientes e os prefere em relação a outros. A mentalidade hedonista proporcionou à indústria a motivação necessária para oferecer produtos baratos, à disposição de todos e a qualquer hora do dia. Essa situação gerou o descontrole e muitos problemas de saúde.
A solução? É o equilíbrio e cozinhar o máximo possível alimentos in natura. Voltar a comer só nas horas certas. Sentar à mesa com a família num ambiente calmo e tranquilo. Cuidar das conversas e falar do que é positivo. Deixar os problemas para outro momento e não ver televisão enquanto come.
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